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INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL DE CAXIAS DO SUL
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22/11/2024
Graduação

Dia da Consciência Negra e o acesso ao Ensino Superior: Faculdade IDEAU debate inclusão e protagonismo

A autora Djamila Ribeiro, em seu livro “Pequeno Manual Antirracista” reflete sobre políticas educacionais afirmativas, considerando que o debate não é sobre capacidade, mas sobre oportunidades. “Um garoto que precisa vender pastel para ajudar na renda da família e outro que passa as tardes em aulas de idiomas e de natação não partem do mesmo ponto”. A autora ainda completa “Não são muitos os que podem se dar ao luxo de cursar uma graduação sem trabalhar ou ganhando apenas uma bolsa de estagiário”.

Utilizando esta reflexão inicial como exemplo, a Faculdade IDEAU não pensa apenas em políticas de inclusão para acesso a instituição de ensino superior, mas em uma educação continua que ofereça possibilidades para que os alunos se mantenham estudando e tenham protagonismo em suas trajetórias.

Reconhecendo meus privilégios como professora branca em uma sociedade estruturalmente desigual, é essencial incluir as vozes daqueles que vivenciam essas realidades diariamente. Para isso, convidei dois alunos negros do curso de Direito para compartilhar suas histórias e perspectivas. O objetivo não é apenas inspirar, mas também dar visibilidade ao impacto do protagonismo negro na luta por equidade.

A alumni Camila de Oliveira Ribeiro, já graduada como Bacharel em Direito, ressaltou a importância de refletir sobre a trajetória histórica da população negra no Brasil, suas lutas, conquistas e desafios. “Como filha de uma empregada doméstica e um metalúrgico, sempre estudei em escolas públicas e cresci com a realidade de muitas pessoas negras que enfrentam barreiras diariamente para alcançar seus objetivos. Minha trajetória até o curso de Direito foi marcada por desafios. O fato de ser mulher, negra e vinda de uma família de classe trabalhadora sempre representou obstáculos, principalmente no que diz respeito ao acesso a oportunidades. No entanto, tive a chance de ingressar na faculdade por meio do ENEM, uma oportunidade que, para muitos, é uma das poucas portas de entrada no ensino superior. Esse momento não foi apenas uma conquista pessoal, mas um reflexo das dificuldades enfrentadas por muitos negros que, apesar de sua capacidade e potencial, enfrentam um sistema educacional e social que frequentemente os marginaliza.”

Camila reforçou ainda a mudança que a graduação representou em sua vida: “O curso de Direito, mais do que uma profissão, representou para mim uma oportunidade de ampliar minha visão de mundo, fortalecer minha voz e compreender melhor as questões sociais, especialmente as que afetam a população negra, e reforçar a importância de uma maior presença de negros e negras em cargos de liderança no campo jurídico, para promovermos uma representatividade real e necessária.”

Já o aluno Andrey de Melo Trindade, atualmente cursando a graduação em Direito, compartilha sua trajetória marcada por superação e determinação. Nascido e criado em uma vila, filho de uma trabalhadora de serviços gerais e de um pai que fazia bicos em obras, Andrey cresceu em um ambiente desafiador, cercado por violência. Ele descreve sua realidade com clareza: “no meio de assassinos, eu vi tudo de perto, o tráfico, as armas. Eu cresci numa realidade muito hostil”. Apesar de ter sido instigado pela criminalidade, sempre buscou vislumbrar um futuro diferente para sua vida: “Eu queria fazer diferente. Eu queria ser diferente. Apesar dos vários percalços… e foi através de uma oportunidade do Fórum de Porto Alegre que percebi que não tinha mais tempo pra ficar ‘badernando’. Eu queria estudar, eu queria aprender. Era na época dos processos físicos, então eu analisava bastante os processos pra poder entender. Eu ficava fascinado naquilo. Eu queria aquilo. E houve várias pessoas lá, com as quais fiz amizade, que me mostraram um caminho diferente”.

Com o apoio de pessoas que encontrou ao longo de sua jornada, Andrey começou a refletir sobre sua realidade e decidiu que queria trilhar um caminho distinto, mesmo enfrentando muitos desafios. Os obstáculos, no entanto, não foram poucos. Ele relata dolorosas experiências de racismo, que se manifestaram de formas veladas, mas profundamente marcantes: “Uma época, pra poder ajudar minha mãe, eu vendia salada de frutas e doces, eu ia em comércios pra poder vender e percebia que as pessoas puxavam a bolsa, não me olhavam, mandavam eu sair… tratado, muitas vezes, como lixo… no mercado percebia o segurança andando atras de mim. Também fiz uma entrevista em um escritório de advocacia de Porto Alegre e a entrevistadora não ficou 5 minutos na sala comigo”.

Essas situações ilustram como o racismo, por mais sutil que possa parecer, carrega uma dor que apenas quem vivencia consegue compreender. Ainda assim, Andrey não permitiu que essas dificuldades o definissem. Ele agarrou as oportunidades que surgiram e transformou sua vida. “Passei no ENEM e consegui bolsa para cursar Direito na Faculdade IDEAU e graças a várias pessoas e professores que passaram na minha vida, me mostraram diariamente que eu não tinha que baixar a cabeça pro racismo, que eu precisava enfrentar os desafios, lutando pela vida que eu quero ter no futuro”.

A história de Camila e Andrey são um exemplo de resistência e perseverança, um testemunho de como a educação e o apoio podem mudar destinos.

A reflexão que o Dia da Consciência negra proporciona nos leva a pensar a história e o presente com um compromisso renovado de construir uma sociedade mais justa e igualitária. Não devemos apenas relembrar as lutas e resistências passadas, mas seguir derrubando as barreiras do racismo estrutural. A inclusão no ensino superior é um passo fundamental nesse caminho, pois a educação liberta e transforma vidas, dando voz aqueles que outras vezes já foram silenciados, para que possam alçar seus sonhos!

Mais do que garantir acesso, a inclusão precisa ser sinônimo de permanência, acolhimento e pertencimento. É sobre criar espaços onde as histórias, culturas e identidades negras sejam valorizadas e reconhecidas. É sobre promover ações que rompam com o ciclo de exclusão estrutural e incentivem o protagonismo daqueles que trazem consigo o desejo de mudança. A luta por equidade no ensino superior é, portanto, uma celebração de esperança e um ato de resistência, reafirmando que o futuro só será verdadeiramente próspero quando todos tiverem a oportunidade de contribuir para sociedade com seus talentos, sonhos e visões plurais.

Autoria: Professora Patricia da Silva

 

 

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